AS EMOÇÕES NA PRIMEIRA INFÂNCIA

Tanto a maternidade como a paternidade têm ganhado um papel diferente, que vai muito além de apenas reproduzir, cuidar e esperar o tempo passar. Os pais, indiferente da formação familiar, têm visto a infância como base para o adulto que será construído no futuro. Assim como as escolas, que vêm se moldando neste novo formato de infância, e deixando de lado o antigo conceito de ser apenas um lugar para as crianças ficarem ou um ambiente de alfabetização.


Recentemente, o filme “Divertida Mente 2”, da Disney e Pixar, trouxe à tona a importância das emoções, já que a personagem Riley vive uma passagem da infância para a adolescência e está aprendendo a lidar com os seus novos sentimentos. O filme, que teve uma grande repercussão e foi assistido por milhões de pessoas, envolve não só as crianças, mas a família como um todo, pois aborda as emoções na primeira infância.


Vinda de uma cultura em que as emoções das crianças não eram validadas, a sociedade hoje tem dado uma atenção especial para o que as crianças sentem. A psicóloga Larissa Vieira de Lima Gonçalves, especialista em Desenvolvimento Infantil e Neuropsicologia, comenta que, de forma geral, as lembranças que temos hoje são de um passado em que as emoções das crianças não eram consideradas, e por vezes eram até ridicularizadas. “Era comum ouvirmos frases como ‘engole o choro’, ‘homem não pode ter medo’ ou ainda ‘não tem o porquê chorar’. Vivíamos em um cenário com menos informações do que vivemos hoje, e os sentimentos da primeira infância não tinham vez”, comenta Larissa.


A psicóloga lembra ainda que outra postura cultural trazida por algumas gerações é de que as crianças são obrigadas a cumprimentar alguns adultos e mostrar interesse por eles, ou ainda emprestar brinquedos a outras crianças contra a sua vontade.


“Nós adultos não temos a disponibilidade de emprestar uma roupa nova ou um relógio preferido. Sempre vamos considerar para quem, se vai cuidar, se é novo e ainda nem usei, ou ainda se negar a emprestar. Então, como obrigamos as crianças a emprestarem um brinquedo novo para uma outra criança que ela acabou de conhecer, por exemplo? A criança está começando a conhecer o mundo, e é
importante considerar que está tudo bem se ela não quiser emprestar.”


Larissa comenta que no seu consultório trabalha muito com as crianças sobre saber reconhecer os próprios sentimentos, além de direcionar sobre o que fazer quando os sentimentos aparecerem: “Uma criança que sente raiva, por exemplo, ela precisa entender que a raiva é dela e aprender como agir, que não justifica usar a raiva dela para bater em algo ou alguém”.


Assim como as emoções na vida adulta, na infância todos os sentimentos são validados, e o que se deve considerar é a intensidade que surgem essas emoções. “O que fazer com os extremos? Esse é o grande ponto das emoções. Elas vão surgir e isso é completamente natural, mas a intensidade que surgem e a forma como são externadas devem ser observadas. Reação emocional é totalmente diferente da birra, a birra virá de forma intensa com o objetivo de obter algo que deseja, fugir de uma demanda ou ainda chamar a atenção. Um exemplo de reação emocional pode ser de uma criança que se joga no chão porque está frustrada por ter recebido uma negativa de algo que queria e não vai ganhar. É importante
validar essa frustração, acolher e explicar para dar uma resolução”, destaca.


Para a empresária Ana Elisy Ramos Macedo, de 33 anos, mãe dos meninos Rafael Macedo Braga, de 10 anos, e Luis Francisco Macedo de Souza, de 3 anos e 10 meses, o maior desafio da maternidade é saber administrar junto com os filhos essas emoções.

-Nós adultos, por vezes, não sabemos administrar o que sentimos, imagine com as crianças. Então, sempre que há algum episódio aqui em casa, seja individual ou entre eles, eu lembro de que eles estão descobrindo suas emoções e que é importante que eu me mantenha equilibrada para auxiliá-los, seja validando algum sentimento ou orientando-os a administrar aquelas emoções que vem à tona. O adulto precisa olhar para essa criança como um ser de vontades, e saber respeitar isso – destaca Ana Elisy.

A ESCOLA COMO ALIADA NO DESENVOLVIMENTO

O ambiente escolar, por ser um espaço compartilhado, pode ser desafiador para as crianças, e as emoções podem surgir com mais facilidade. E é nesse contexto que a escola tem um papel fundamental. A psicóloga e terapeuta pelo método DIR/Floortime, Gabriela Albernaz Monteiro, detalha sobre o assunto.


De acordo com ela, a escola não tem como focar só no aprendizado, mas precisa olhar para todos os aspectos como o sensorial, o motor, o cognitivo e o emocional também. Ela entende que os comportamentos em geral estão ligados às emoções, e que, apesar de muitos pais estarem preocupados com o ensino do filho, “a escola é muito mais que isso”.


“Todos os aspectos, emocionais, motores, cognitivos e sensoriais estão conectados. Nunca será só a emoção, nunca será só o corpo, estão interligados. O primeiro órgão desenvolvido em um feto é o coração, depois o cérebro. Além disso, a sua audição é desenvolvida no quarto mês de gestação da mãe. As conexões começam a ser criadas e a criança já começa a aprender”.


Gabriela completa dizendo que a sociedade tem vivido um grande desafio geracional, de considerar e respeitar a criança, tratá-la por completo, observar e cuidar das questões emocionais, assim como são cuidadas as questões físicas.

-Nem sempre uma reclamação vinda da escola é só uma reclamação, pode servir como um alerta para a
família. Assim como a escola tem a responsabilidade de preparar uma equipe multidisciplinar capaz de orientar os professores nesse processo em que eles funcionam como mediadores no aprendizado das crianças. E é nesse momento que é importante que exista um vínculo afetivo, para que esse processo aconteça, efetivamente. É através da conversa que é possível descobrir o que a criança está sentindo, e não só falar sobre como ela está se comportando. A escola é fundamental na descoberta e acolhimento das emoções junto com a família – finaliza a psicóloga Gabriela.